Despertar para o direito

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Ida de Flávio Bolsonaro ao STF devia ser algo normal

O movimento de escárnio com relação aos direitos e garantias estabelecidos pela Constituição foi acompanhado, nos últimos dias, pela forma pejorativa com que parte da classe política e da opinião pública tratou a decisão do senador eleito Flávio Bolsonaro de buscar a efetivação daquilo que ele entende ser seu direito junto ao Supremo Tribunal Federal. Assim, ele lançou mão de uma reclamação contra atos que ele e sua defesa acreditam ser praticados ilegalmente pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.

O acesso à Justiça é um direito constitucional do cidadão. Isso deveria ser algo normal e alheio ao debate partidário. As diversas correntes ideológicas, da esquerda e da direita, insistem, no entanto, em instrumentalizar o acesso à Justiça para a política. Vimos, nos últimos anos, grupos militantes se revezarem no deboche em relação aos adversários.

Trata-se de uma atitude prejudicial ao país, sobretudo nesta fase de ajustes institucionais e de superação de crises. O direito não existe para amigos ou inimigos, simpatizantes ou adversários. Ele deve, simplesmente, ser assegurado a todos.

É preciso que os atores políticos rompam, urgentemente, com o entendimento de que “o direito para os meus é legítimo, mas para os adversários é privilégio”. Esse é um dos principais desafios da democracia neste momento que marca o período democrático mais longevo da história nacional e que pede por proteção e reforço nas estruturas da República e do Estado de Direito.

Uma das tarefas permanentes mais importantes para atingir essa finalidade é relembrar e aplicar a ideia, sintetizada na figura de olhos vedados que representa a Justiça, de que a aplicação da lei, de suas sanções e garantias deve ser imparcial, independentemente de (“sem ver”) quem está sendo processado e julgado.

As garantias constitucionais asseguram a efetivação dos direitos. Um exemplo, muito relacionado ao caso em questão, está no inciso 34 do artigo 5º da Constituição, que esclarece que é assegurado a todos o direito de peticionar aos Poderes públicos “em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”. Claro que a existência da ilegalidade apontada pelo reclamante deverá ser avaliada como procedente ou não pelo Judiciário.

Já os remédios constitucionais, como é o caso da reclamação apresentada pelo senador, existem para proteger direitos e funcionar como filtros contra eventuais erros do sistema judicial. Se este é o caso em questão, só será possível saber quando a Justiça terminar de apreciá-lo. Mas nenhuma instância está imune ao engano, como mostram casos recentes.

No fim de 2018, por exemplo, vimos no próprio STF o resultado histórico de recursos de defesa que conseguiram inocentar, com base na análise científica de materiais genéticos, um homem erroneamente condenado por estupro no Rio Grande do Sul e que chegou a passar dez anos preso.

Os fatos da política nacional e os atos praticados pelas autoridades têm ampla repercussão no dia a dia da população, servindo como parâmetro para atuação de todos os agentes públicos. É preciso, portanto, que os atores políticos abandonem a análise maniqueísta das leis e do sistema judicial e passem a disseminar o respeito às instituições e aos instrumentos da democracia.

Esse tipo de visão confronta os preceitos do Estado de Direito, no qual devem vigorar o império da lei, a limitação do poder estatal e a prevalência das garantias fundamentais do ser humano, independentemente de quem seja o beneficiado.

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